sábado, 24 de novembro de 2007

ENTRE NÓS E OS OUTROS

A 'QUESTÃO PALESTINA' VISTA POR EDWARD SAID, 'PARADISE NOW' E AS PERSONAGENS DOS CONTOS PALESTINOS
RESUMO
A divisão da Palestina, em 1947, gerou grandes problemas para a população muçulmana local e para os países árabes vizinhos. Desde então ocorreu um grande êxodo de paletinos de suas terras para vários lugares, principalmente, para o Líbano.
A temática da expulsão de suas terras, a impossibilidade de retorno, a violência dos israelenses, dentre outras, passou a fazer parte do repertório de questionamentos do intelectual palestino – radicado nos Estados Unidos – Edward Said. Através de seus ensaios, livros e artigos, Said critica com bastante veemência a ação dos israelenses.
Essa violência também é o tema dos contistas palestinos e cineastas, às vezes com mais poesia e subjetividade, mas ainda assim crítica. A “Questão Palestina” é o objeto desse artigo e, através dos ensaios de Said, de contos e do filme “Paradise Now” será analisada.
PALAVRAS-CHAVE
Contos Palestinos, Edward Said e “Paradise Now”.

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sexta-feira, 2 de novembro de 2007

CRISE NO ORIENTE MÉDIO


Entrevista publicada em CENÁRIO INTERNACIONAL em 31/10/2007 - ISSN 1981-9102. Disponível no site: http://www.cenariointernacional.com.br/ri/default2.asp?s=entrevistas2.asp&id=505

O Oriente Médio há muito está nas primeiras páginas dos maiores noticiários do mundo. São inúmeras crises como o histórico conflito entre palestinos e israelenses; a guerra do Iraque; a ameaça dos EUA para bombardear as instalações nucleares do Irã, e mais recentemente, a Rússia acaba de fechar um controverso acordo com o Irã para cooperação nuclear, e o Parlamento turco acaba de aprovar uma incursão militar no norte do Iraque, região curda, onde a situação é relativamente tranqüila, entre outros. Com isso, os EUA advertiram o mundo sobre o risco de uma Terceira Guerra Mundial.

Cenário Internacional: Estamos presenciando uma escalada das hostilidades entre os governos da Rússia e dos Estados Unidos. Os norte-americanos querem instalar um escudo antimíssil no Leste Europeu, com o argumento de impedir que o terrorismo se espalhe pela Europa. Já a Rússia, acaba de fechar um acordo de cooperação nuclear com o Irã. Estamos vivendo uma 2ª Guerra Fria, ou estamos sob o risco de uma 3ª Guerra Mundial?

Renatho Costa: Tanto na Guerra Fria quanto nos dias de hoje, o que baliza o poder de um ator no sistema internacional é sua capacidade bélico-nuclear. É certo que com a desestruturação da URSS, os EUA conseguiram espaço para estabelecer um novo paradigma – levando-o a ser considerado, por alguns analistas, como um ator hegemônico –, no entanto, a Rússia herdou o poderio nuclear soviético e foi somente uma questão de tempo – até reestruturar sua economia – para que voltasse a se impor. Partindo desse pressuposto, a observação que cabe ser feita, no que tange aos objetivos da Guerra Fria e do momento atual, é a de que não mais está em jogo um embate ideológico, mas sim a rearticulação de posições no cenário internacional. Outro aspecto relevante, que é mencionado nessa pergunta, diz respeito ao fenômeno do terrorismo. Quando se parte dessa argumentação para defender qualquer que seja a proposta, a tendência é de que ela já seja percebida como legítima, assim, de difícil contestação pelos demais atores internacionais. Isso é, mesmo que – analisando a proposta do escudo antimíssil por outro prisma – percebamos que sua implantação significaria um risco maior para a segurança nacional russa que simplesmente um meio eficaz para proteger os aliados europeus dos EUA de ações terroristas. Assim, é bem provável que não estejamos na iminência de uma 3ª Guerra Mundial, mas sim, percebendo que a Rússia está tentando recuperar seu status e, para isso, utilizará todas as formas de argumentação, inclusive, aliados que mais se encaixariam no modelo “inimigo do meu inimigo, é meu amigo” – numa referência direta ao Irã. Assim, evidencia-se o fato de que o equilíbrio continuará sendo balizado pelo poderio bélico-nuclear. E nenhum dos atares pretende iniciar uma guerra que trará o fim a todos! O que ainda não é possível afirmar é se a Rússia estará disposta a proporcionar as condições necessárias para que o Irã se torne um ator capaz de enfrentar os EUA – e a própria Rússia, seguindo essa lógica – ou se precisará encontrar outra maneira para proteger os seus interesses perante os EUA.

Cenário Internacional: É possível desenhar um cenário se caso os Estados Unidos bombardearem as instalações nucleares do Irã?

Renatho Costa: No momento atual, acredito que essa opção não seria a melhor estratégia a ser adotada pelos EUA. Isso porque, uma provável retaliação iraniana viria sobre os aliados dos EUA no Oriente Médio. No entanto, partindo dessa hipótese, poderíamos ter a intensificação das ações do Hizbullah contra Israel, ao mesmo tempo em que o Irã poderia priorizar o investimento de milícias xiitas no Iraque – em retaliação direta à presença estadunidense naquele território. Um provável enfrentamento do Irã contra Israel talvez não acontecesse num primeiro momento, mas se os EUA continuassem com ações belicosas, essa poderia ser uma opção para expandir a crise. Até porque, se houver a possibilidade de enfraquecer o Estado de Israel, automaticamente abrirá a possibilidade para que os palestinos insurjam (uma terceira intifada?!). Também abriria um flanco para retaliações contra a Arábia Saudita, sunita e aliada dos EUA. A situação no Oriente Médio é sempre muito tensa e o equilíbrio se dá através de uma linha muito tênue. Os iranianos, tendo isso em vista, sabem que uma ação militar estadunidense somente ocorrerá em última instância, o que está ainda mais longe de acontecer. Imaginar que os EUA poderiam alcançar êxito com três frentes de batalhas na região (Afeganistão, Iraque e Irã) seria, no mínimo, considerar o suicido eleitoral para aqueles que pretendem continuar vendo os Republicanos na Casa Branca (mas essa questão mereceria uma análise pormenorizada, tendo em vista o crescimento dos Democratas).

Cenário Internacional: Uma invasão turca ao norte do Iraque pode envolver outras nações, como o Irã e a Síria. Os EUA já advertiu a Turquia para que isso não seja feito, mas o Parlamento turco já aprovou uma incursão militar na região. Gostaria que fosse feito um comentário sobre esse assunto.

Renatho Costa: A Turquia trata a situação dos curdos no norte do Iraque como uma questão de segurança nacional. A relação entre turcos e curdos remete ao próprio passado das duas nações e à supremacia dos primeiros. Assim, considerar que haveria a possibilidade da tentativa de mudança de status por parte dos curdos sempre foi factual, o que não havia eram circunstâncias favoráveis. Ocorre que com o esfacelamento do Iraque, os curdos do norte do país vislumbraram a possibilidade de criação de um estado independente, e mais, a anexação da parte curda da Turquia a esse novo estado idealizado. Entretanto, outros países também possuem população curda em seu território – Irã e Síria –, e acabariam sendo afetados pelo conflito. Assim, a preocupação territorial acaba sendo diminuída quando se analisa o procedimento desses dois Estados no passado. Síria e Irã deram apoio aos milicianos curdos contra a Turquia, facilitando suas ações através de seus territórios. Isso se deu por motivos distintos, o Irã, na intenção de expandir seu regime fundamentalista à Turquia; e a Síria, devido haver dois contenciosos com a Turquia, quais sejam, a reivindicação da divisão das águas dos rios Tigre e Eufrates, além da posse da província de Hatay (sob controle turco). Evidentemente que a Turquia se opõe com veemência a qualquer possibilidade de criação de um Curdistão, no entanto, as milícias curdas do Iraque – comandadas pelo PKK (Partido Curdo dos Trabalhadores), considerado terrorista pelos EUA, UE e OTAN – tendem a aproveitar a situação de desgoverno no país para colocar em prática o seu projeto nacionalista de independência. Constantemente os milicianos programam incursões ao território turco, o que, em tese, abriu a possibilidade para que o governo turco retaliasse (inclusive envolto na legitimidade atribuída pela Carta das Nações). Com isso temos duas situações distintas: os EUA não pretendendo que o conflito no Iraque se expanda, no entanto, tendo a Turquia como aliada, deve considerar a preocupação com a insurgência curda na região e os constantes ataques que sofre dos milicianos curdos; por outro lado, existe uma divergência quanto à posição relativa à criação do Curdistão. Os EUA apóiam e isso abala a relação com a Turquia. Nesse panorama extremante complexo, a Síria e o Irã, que já utilizaram o PKK contra a Turquia – hoje já romperam com essa aliança –, continuam atentos ao desenrolar da situação. Como inimigos da Turquia, poderiam entrar no conflito para fazer seus “acertos de contas”, mas somente atuarão se o risco de sofrerem retaliações for pequeno. Isso porque, qualquer erro estratégico poderia fazê-los sofrer com os efeitos colaterais de uma invasão ao território curdo no Iraque. Situação tal que acabaria gerando um grande êxodo da população curda para o Irã e a Síria, algo que nenhum dos dois gostaria de ter.

Cenário Internacional: A Secretária de Estado dos EUA, Condolezza Rice, está empenhada em firmar um acordo de paz entre os palestinos e israelenses, chamada de “Cúpula da Paz”, que será realizada em dezembro em Anápolis, nos EUA. É possível que esse acordo saia realmente das boas intenções, e seja estabelecido um verdadeiro acordo de paz e de coexistência pacífica entre esses povos?

Renatho Costa: O governo Bush, definitivamente, não passará para a História por ter sido um viabilizador da paz entre israelenses e palestinos. A “Cúpula de Paz” está muito distante de se parecer com outros momentos em que quase foi firmada a paz, até porque, essa questão não é prioritária na Agenda neocon de Bush. Hoje, com uma liderança palestina questionável e a dissidência do Hamas, mesmo que tenhamos representantes palestinos em Anápolis – como se apresenta –, com toda certeza, o que for acordado por lá não terá legitimidade suficiente para ser imposto a todos os palestinos. A “Cúpula de Paz” assume, apenas, ares de um ato que visa demonstrar “boa vontade” na tentativa de encontrar uma solução para o conflito israelo-palestino que se arrasta há sessenta anos. Ato como esse somente caberia a um ator hegemônico como os EUA; no entanto, segundo a visão de Edward Said acerca das demais tentativas de acordos, “não é possível partir para uma negociação quando as bases inicias já predispõem a derrota de uma das partes”. Said, com isso, queria salientar o fato de que negociar com Israel é aceitar que a Palestina ambicionada por seu povo não mais existe e, tampouco, existirá. É uma visão muito objetiva dos fatos e que pode ser assimilada por diplomatas e pessoas habituadas a discutirem questões relativas a perdas e ganhos, no entanto, quando o aspecto religioso e a intransigência de parte a parte não propicia a mudança do status quo adquirido, torna-se improvável que o retorno das delegações diplomáticas, de Anápolis à Palestina e Israel, traga, consigo, algo mais que a sensação de frustração. Condolezza Rice deixa bem clara a postura dos EUA de que não negociará com organizações terroristas e não aceitará pressão. Uma posição dura que os EUA vêm assumindo desde 11/09, no entanto, nesse caso em particular, os palestinos acabam sendo prejudicados porque a criação de um Estado Palestino, priorizado por Rice, demora a nascer e a insatisfação quando for delimitado seu território será latente. Isso, se conseguirem avançar mais um passo nesse sentido.

Cenário Internacional: É possível desenhar um cenário para a Guerra do Iraque?

Renatho Costa: Num panorama de tanta instabilidade, como é o caso do Iraque, a opção por um cenário mais propício a se revelar, pode, de uma hora para outra, acabar sendo a última opção de análise, contudo, é fundamental que tentemos entender para onde o Iraque caminha e quais as conseqüências dos próximos atos. Primeiramente, temos de considerar o surgimento de um estado curdo no norte do Iraque como um fato quase que irreversível. Caberia, sim, discutir os limites territoriais desse estado, haja vista existir uma disputa por uma região muito rica em petróleo e que proporcionaria tranqüilidade econômica para o Curdistão iraquiano. Cabe-nos considerar, também, que a democracia – apregoada pelo Ocidente como um valor universal –, não conseguiu resolver o conflito entre muçulmanos xiitas e sunitas. Talvez, com a utilização do modelo democrático proposto por Lijphart, onde haveria a divisão do poder entre os grupos religiosos – conhecida por teoria consocionalista – poderíamos ter tido algum ganho, mas isso não aconteceu. O Iraque continua cindido e a probabilidade de que haja um governo de coalizão entre os grupos religiosos é pequena. Nesse sentido, abre-se a possibilidade para que o Iraque seja dividido entre xiitas e sunitas. Possibilidade não aceita pelos EUA, uma vez que a parte xiita poderia se aproximar do Irã e, por conseguinte, se tornar seu país. Comprometendo, também, a estrutura geopolítica da região. Não podendo ser dividido e também não conseguindo se manter unificado, a maneira encontrada para preservar um estado que não mais existe é manter as tropas no local. Os EUA estão pagando um preço mais alto do que o esperado pela ação no Iraque, entretanto, a saída do país só se dará se forem cumpridas as exigências necessárias para que o país siga independente, ou seja, improváveis para o momento. Assim, seguem os EUA no Iraque. Com promessas de retirada de tropas, mas ainda tudo permanece no plano da retórica. O que pode vir a mudar essa situação é o efeito das ações terroristas. Podem tirar aliados dos EUA do Iraque, mas só fará com que os EUA se retirem completamente se uma ação terrorista conseguir superar os atentados de 11/09. É a senda reta no sentido do neo-terrorismo!