sábado, 13 de outubro de 2012

"PODE-SE DISCUTIR SE NA REELEIÇÃO DE CHÁVEZ HOUVE PLENA DEMOCRACIA, MAS O SISTEMA DA VENEZUELA RATIFICOU TODO O PROCESSO"


Na última segunda-feira, 08 de outubro de 2012, foi confirmada a reeleição do presidente venezuelano, Hugo Chávez. Depois de ter superado um longo processo de luta contra o câncer, decidiu concorrer à reeleição no intuito de continuar o processo de estabelecimento da "Revolução Bolivariana".

No poder, desde 1999, Chávez já passou por situações extremamente difíceis na presidência, desde promulgação de uma nova constituição para o país, referendo e tentativa de golpe. Mas, para esse novo mandato, as dificuldades são outras, uma vez que o processo democrático sedimenta-se cada vez mais.

Apesar da vitória de Chávez, o candidato Henrique Capriles reforçou, em seu discurso de reconhecimento da derrota, que o cenário político na Venezuela é outro e que Chávez terá de governar para todos os venezuelanos, inclusive para os 44,9% que foram contra sua reeleição. Com isso, a Venezuela entra em outro momento de sua história e Chávez terá de fazer alterações em seu programa de governo para que gere estabilidade.

Sobre essas questões, conversei com a jornalista Cristina Coghi na última segunda-feira, 08/10. Abaixo segue o link com o áudio da entrevista.

"OS IRANIANOS NÃO SÃO CONTRA OS JUDEUS", DIZ ESPECIALISTA EM ORIENTE MÉDIO

Por: Illgner Geovanne
13 de outubro de 2012 às 12:15 pm | Postado em: EntrevistasNotícias



O Irã é retratado pelos EUA e Israel como uma nação perigosa e inimiga da paz no Oriente Médio, assim como são classificados outros países da região. Apesar dos iranianos insistirem que o seu programa nuclear é para fins pacíficos, os norte-americanos e israelenses acreditam que o país está próximo de desenvolver uma bomba atômica.

Os EUA e seus aliados estão certos ou não?
Para tratar das questões que envolvem o Irã, o IAnotícia conversou com o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), Renatho Costa. O especialista em Oriente Médio e terrorismo esteve no país persa entrevistando aiatolás, professores e parlamentares.
(IAnotícia) – Os EUA e Israel tem motivos para acreditar que o Irã está construindo uma bomba nuclear?
(Renatho Costa) – Se considerarmos apenas os aspectos técnico-científicos, é provável que o processo de enriquecimento de urânio possa viabilizar-se no futuro (e aqui a especulação temporal também se configura em parte da estratégia que visa atender outros pressupostos, e não estão ligados diretamente a uma análise sobre o desenvolvimento científico) em tecnologia suficiente para a produção de armas nucleares. Tudo depende do interesse de quem desenvolve esta tecnologia e das condições pelas quais este país é submetido. É conveniente para EUA e Israel adotarem a política do “risco Irã”, pois, com isso, tentam construir o entendimento de que o Irã está desenvolvendo a tecnologia nuclear para alcançar a produção de armas e iniciar uma guerra. Historicamente, o desenvolvimento desta tecnologia somente tem sido utilizado para mudar o status quo [situação atual] de quem a detém, no sistema internacional, nunca para desencadear uma guerra (exceção feita aos EUA que utilizaram armas nucleares no final da Segunda Guerra, contra o Japão). Até porque, é notório o conhecimento de que os possíveis adversários de um suposto “Irã nuclear” também detenham a tecnologia e não hesitariam em contra-atacar utilizando armamentos muito superiores. Com isso, saliento que o “motivo para acreditar” guarda maior relação com o perigo de mudança geopolítica na região do Oriente Médio do que risco real de um futuro ataque iraniano.
(IA) - Como o programa nuclear iraniano é tratado internamente? Existe algum tipo de 
propaganda que essa tecnologia será positiva para a população, como o governo brasileiro faz sobre o pré-sal?
(RC) – Existe propaganda nesse sentido, sim. Mas até onde pude perceber, ela é tratada de duas maneiras, ou seja, primeiramente enfatiza-se a necessidade do desenvolvimento desta tecnologia para fins pacíficos, pois o país tem problemas com a geração de energia. Fora o petróleo, não há outra forma de produção, e, nesse sentido, a energia nuclear seria uma saída interessante para o desenvolvimento do país. Ainda, como os embargos econômicos impedem que o Irã tenha acesso a muitos produtos internacionais, há a necessidade de que ali sejam criadas condições para sua produção, e, para tanto, muitas vezes a tecnologia nuclear é um requisito básico. Então, há a propagação de que o Ocidente não pode interferir ainda mais no desenvolvimento do Irã. Todas as dificuldades que o país vivencia no momento têm origem nas restrições que são impostas internacionalmente, contudo, mesmo assim, ainda é perceptível o desenvolvimento do país (até, em alguns aspectos, reforçando os preceitos religiosos xiitas), por isso o governo iraniano vincula o desenvolvimento da tecnologia nuclear à própria preservação da soberania do país. Não se trata, para o governo, de uma intervenção (dos EUA) que vise “a segurança regional”, mas, sim, uma ação contra o desenvolvimento do país. E a grande maioria da população iraniana reage positivamente ao clamor do governo, pois acaba entendendo como uma questão de manutenção de sua soberania. Não pude perceber, tampouco li qualquer documento (oficial ou através de jornais, revistas, etc.) que sugerisse que o governo iraniano tenha interesse em desenvolver armamentos nucleares. Se há a intenção, e não posso descartá-la, uma vez que pode ser tratada dentro de outras instâncias de governo, não é trazida à população para buscar endosso.
(IA) – Israel considera o Irã como uma ameaça, e os iranianos, como veem os israelenses?
(RC) – O Irã não reconhece a legitimidade de o Estado de Israel existir nas circunstâncias em que foi criado. Isso, frequentemente é propagado pelo presidente Ahmadinejad e pude constatar junto às pessoas que tive a oportunidade de entrevistar (alguns aiatolás, professores, parlamentares, etc.). O grande questionamento acerca do Estado de Israel é que ele foi criado a partir da expropriação de um povo (palestino) e que esse ato foi resultado da política do Ocidente de enfraquecer os muçulmanos. Além de os xiitas considerarem de suma importância a região da Palestina para todos os muçulmanos. Mas é importante salientar que os iranianos não são contra os judeus, a crítica feita à criação do Estado de Israel é focada nos sionistas, que, para os iranianos, foram os grandes responsáveis pela violência ocorrida na Palestina no início do século passado e, nos dias de hoje, para a preservação de um modelo de estado que restringe os direitos dos palestinos.
(IA) – A grande mídia passa uma imagem de que os árabes e persas são antiamericanos e terroristas. Como os iranianos consideram os EUA?
(RC) – Existem pontos de vistas distintos sobre a atuação dos EUA, principalmente oriundo da capital do país, Teerã, no entanto, a visão do governo e da grande maioria da população é de que os EUA são um agente desestabilizador da região e, em muitos casos, utilizam a tática terrorista para impor seus interesses. Muito constantemente os EUA são tratados como um país que pratica o “terrorismo de estado”, e, para justificar essa argumentação, lançam mão de inúmeros exemplos de atuação dos EUA na política interna de países do Oriente Médio para satisfazer seus interesses. O próprio Irã foi vítima da ação dos EUA em 1953, quando a CIA elaborou o golpe que depôs o primeiro-ministro Mossadegh e preservou o xá no poder. Sobre esse evento e o posterior apoio que os EUA deram ao governo ditatorial do xá, há repercussão negativa ainda nos dias de hoje. Constantemente os EUA são acusados de atacarem o Islã, tendo em vista sua atuação pontual em países como o Egito, Líbano, Iraque, Afeganistão, além do apoio à Arábia Saudita e Bahrein (em ambos os países há ditaduras sunitas, muito severas aos xiitas). Ainda há uma crítica muito severa quanto à atuação dos EUA no intuito de fragilizar a cultura xiita iraniana através do patrocínio de redes de TV e rádios que produzem programas em farsi [língua persa] que são transmitidos, via satélite, para o Irã. Muitas dessas emissoras de rádio e TV estão instaladas nos EUA e produzem programas “ocidentais” para serem consumidos pelos iranianos. Sob o ponto de vista de alguns iranianos, isso se configura numa tentativa espúria de destruir uma cultura local. Essa questão é mais complexa e ainda estou desenvolvendo algumas pesquisas nesse sentido, mas, de fato, há inúmeras emissoras criadas que não poderiam sobreviver sem auxílio financeiro de algum estado ou instituição que vise exclusivamente enfraquecer o governo iraniano, uma vez que toda a produção é voltada para um país e nada é comercializado nesses veículos. Sob a perspectiva do Mercado, é muito difícil imaginar quem poderia investir num produto que não apresenta qualquer retorno financeiro para seu investidor. Isso é o que ocorre com essas emissoras. 
(IA) – Na sua opinião, seria legítimo os iranianos se armarem com uma bomba nuclear para aumentar a defesa contra os avanços norte-americanos no Oriente Médio?
(RC) – Entendo que seja altamente questionável o modelo que permite que alguns estados detenham essa tecnologia e outros não. O processo que levou a esse modelo subentendia a criação de compensações para que determinado estado abrisse mão de trilhar seu caminho no intuito de desenvolver armamentos nucleares e, consequentemente, “ceder o direito de se defender em iguais condições”. Hoje, o Irã é um país excluído economicamente, contudo, assinou o tratado de não proliferação de armas nucleares e constantemente ratifica seu posicionamento. Contudo, digamos que ele quisesse romper com esse tratado e passasse a desenvolver armamentos nucleares, entendo que seria questionável a imposição de sansões. Até porque, como mencionei anteriormente, Paquistão, Índia, China, Rússia e Israel possuem armamentos nucleares e fazem parte da mesma região. A obrigação do Estado é proporcionar segurança para seus nacionais e o Irã está entre alguns estados hostis e outros que poderiam assim se transformar, caso houvesse uma mudança de conjuntura, assim, é muito complicado impor a um país a obrigação de não desenvolver armas nucleares quando o Estado de Israel, que sequer é signatário do tratado de não proliferação de armas nucleares, possui incalculáveis ogivas nucleares. Israel cobra um procedimento por parte do Irã, contudo, atua de modo completamente contrário. Ainda, dentro da lógica de um sistema internacional anárquico, não é possível afirmar que um estado seja mais confiável que outro, pois todos atuam a partir de perspectivas pragmáticas.
(IA) – As últimas informações divulgadas sobre o Irã mostram que o país enfrenta um grave problema econômico, devido as sanções aplicadas pelos EUA e Europa. Protestos em massa já começaram a ocorrer. O Irã pode sofrer uma revolução e o governo de Ahmadinejad pode ser derrubado?
(RC) – Existem movimentos contra o posicionamento do presidente Ahmadinejad, mas seu governo já está no final do mandato, então o grande questionamento que se faz é quem será seu sucessor e se manterá essa política de enfrentamento ao Ocidente. Lembrando que o ex-presidente Khotami tentou iniciar um processo de “diálogo entre civilizações”, mas não conseguiu avançar, devido às restrições impostas pelo Líder Supremo, aiatolá Khamenei. Mas sobre essa questão, tive a oportunidade de entrevistar o aiatolá Hodavi, no ano passado, e o questionei sobre o porquê de o “diálogo entre civilizações” ter sido interrompido, e a resposta dele foi clara e objetiva: “Não somos contra o diálogo, apenas não queremos que seja um monólogo entre civilizações”. Para Hodavi, o processo imposto pelos EUA e Ocidente (de um modo geral é como tratam seus adversários) visa impor uma agenda ao Irã e suprimir sua liberdade. Por essa razão que dificilmente grupos minoritários que visem uma maior aproximação entre Irã e Ocidente conseguirão ganhar espaço na política iraniana. Qualquer que seja o próximo presidente, não entendo que seja possível uma aproximação imediata, até porque o poder político-militar está concentrado nas mãos dos aiatolás e não tem razão para cedê-lo neste momento.
(IA) – Informações de veículos de imprensa como a CNN e Reuters indicam que o Irã está ajudando o governo sírio de Bashar al-Assad na guerra contra os rebeldes. Qual seria o interesse do Irã nesse auxilio?
(RC) – Para responder essa questão temos de nos reportar à situação geopolítica do Oriente Médio. A partir do início da década de 1980 houve o surgimento do Hezbollah (grupo xiita) no Líbano. Foi um período em que o país vivenciava uma guerra civil (1975-1990) fratricida que ainda contava com a participação da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), Israel, ONU, Síria e inúmeras milícias dentro do conflito. Nesse cenário completamente caótico, o alinhamento pragmático entre Síria e Irã acabou surgindo para preservar a influência de ambos no Líbano. Por um lado, o Hezbollah (por serem xiitas, tinham como líder religioso o aitolá Khomeini, líder supremo da Revolução Iraniana) recebia apoio material do Irã através da Síria e a esta também se beneficiava das ações da organização libanesa, principalmente na luta contra o Estado de Israel. Posteriormente, com o final da guerra civil libanesa, a Síria estreitou ainda mais seu relacionamento com o Irã, pois o isolamento dos iranianos no sistema internacional trazia poucas portas para o país continuar atuando. Em contrapartida, o Irã passou a apoiar institucionalmente o governo de Assad e fornecer suporte militar. Ambos têm Israel e EUA como inimigos e, nesse sentido, uma aliança programática foi construída e vem sendo mantida. Se, de um lado os “rebeldes sírios” são patrocinados por vários países do Ocidente, por outro, o Irã continua a apoiar a Síria porque a substituição de Assad por qualquer outro governante que esteja alinhado aos EUA alterará a geopolítica local e deixará o Irã ainda mais isolado. Essa é uma relação fundamentada em interesses políticos recíprocos, uma vez que não fazem parte do mesmo grupo religioso, pois Assad é alauíta e os iranianos, xiitas. O Irã tentou criar condições para que o governo de Assad fosse transmitido para algum sucessor que preservasse as relações com o Irã, no entanto, a situação não permitiu e o conflito teve início. Por razões semelhantes, Rússia e China não tem interesse em autorizar o uso da força contra a Síria, uma vez que o governo de Assad representa um antagonista de peso contra EUA e Israel no cenário do Oriente Médio.
Renatho Costa
Professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do Pampa (Unipampa)
Especialista em Oriente Médio e Terrorismo
E-mail: renathocosta@unipampa.edu.br
Blog: www.rcacademico.blogspot.com
Twitter: @renathocosta
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